A Senhora dos Vermes

"A noite começava a chegar e o calor dos desertos dava lugar a um frio insuportável. Eu era jovem e estava coberto de ambições, viajávamos em um grupo de quatro aventureiros destemidos. Nos arriscávamos naquelas areias atrás de um dos inúmeros tesouros que Sharionn oculta. Mas na escuridão de nada mais adiantaria caminhar, precisávamos parar. Montamos acampamento e repartimos algumas provisões, dividimos a guarda naquela noite e os deuses nos agraciaram com um descanso tranquilo. Mas eu diria que aquela foi a calmaria antes da tempestade e aposto que meus antigos companheiros diriam o mesmo se tivessem essa oportunidade.


Quando a manhã chegou levantamos acampamento, foi então que tudo começou. Um som de algo se arrastando foi ficando cada vez mais alto até que ele pareceu vir de baixo de nossos pés, nos alarmamos e nos preparamos para um possível ataque, porém não podemos prever o que viria. Um gigantesco verme das areias surgiu e assustou a todos, eu acreditei que aquele seria nosso fim, mas me enganei. Era só o início de nosso tormento. Na mesma velocidade em que ele surgiu ele voltou a se recolher no buraco de onde tinha saído, a areia sedia com nosso peso eramos tragados para dentro da terra. Um de nossos camelos foi devorado pela fera no primeiro ataque os outros desapareceram quando as areias nos carregavam para baixo. Novamente acreditei ser o fim e novamente me enganei.

Quando tudo acabou ainda estávamos vivos, mas agora em uma espécie de túnel, o local estava escuro, as areias que vieram conosco cobriam qualquer passagem que pudesse haver para o outro lado. Acreditamos que aquilo era o caminho que a besta que nos atacou fizera e isso nos deixou mais apavorados, apesar de termos perdidos nossos animais ainda conservávamos nossas provisões. Acendemos algumas tochas e começamos a andar, haveríamos de encontrar alguma saída, ou assim esperávamos.

Foram dias caminhando por túneis incontáveis, havia momentos em que inúmeros túneis se encontravam e ficávamos perdidos, nossas provisões eram poucas e mesmo racionando começamos a passar fome, ainda perdemos um companheiro, devido a ferimentos do primeiro ataque, o que nos deu alguma pouca comida a mais e colocou mais desespero em nossa situação, éramos agora três e continuávamos perdidos. Nos dias que se seguiram começou o pior, vários vermes da areia menores que o anterior nos atacaram, conseguimos algumas vitórias mas o último ataque levou mais um de nós. Agora dois caminhavam em desespero completo. Havia comida suficiente para um e não havia previsão para quando sairíamos dali, os túneis se revelaram um gigantesco labirinto e a fome e o desespero nos corroía. Meu companheiro já perdia a sanidade, quando decidimos fazer a última refeição ele me atacou dizendo que teria mais chance só, não sou um combatente, mas sei me defender, evitei a fúria insana com que me atacava e quando não havia mais para onde escapar vi o fim de minha vida se aproximar. Mas os deuses brincavam comigo e mais uma vez minha hora foi adiada.

Quando meu companheiro ensandecido se preparava para desferir o golpe que terminaria nossa peleja, aquela besta abissal que nos atacou no início disso tudo surgiu novamente pela parede arenosa do túnel em que estávamos e devorou o homem que me atacava. Me encolhi e fechei meus olhos, o medo tomou conta de mim e não me movi pelo que me pareceram horas. Quando abri os olhos o que vi foi nossa bolsa com as precárias provisões que sobraram, os restos de meu antigo companheiro e o túnel que a fera havia deixado quando o atacou, fui por ali. Caminhei por horas, ou até mesmo dias, não saberia dizer, tinha uma única tocha antes de entrar naquele caminho e ela se apagou horas depois que meu último amigo morreu na tentativa de me matar. Mas enfim eu cheguei em algum lugar, estava iluminado, se me recordo bem era um salão, archotes por todos os cantos forneciam luz, no centro dele havia um cadeirão e lá estava sentada a mais bela mulher que já vi, tinha pele albina e cabelos negros como a noite. Eu poderia sorrir com aquela visão, mas aos pés dela estava aquele imenso verme que nos atacou no início desta história e que me salvou a vida, mesmo que eu não acredite que isto foi proposital. A mulher falou comigo, disse-me que eu havia vencido o desafio e parecia divertida com aquilo, me apontou uma mesa e disse que eu poderia me servir à vontade. A fome me tirou a prudência e comi sem fazer delongas. Ela me contou que os vermes eram seus servos e que as vezes alguns viajantes caiam nos caminhos que eles faziam nos desertos e que poucos homens chegaram ali vivos, a maioria se perdia. Ouvia a tudo com uma cara de espanto. Mas talvez o cansaço de tudo aquilo ou algo que ela tenha colocado na comida me fizeram dormir profundamente.

Quando acordei já não estava naquele salão subterrâneo, estava em um oásis, ao meu lado haviam duas bolsas, quando as abri encontrei em uma meus pertences e a outra estava repleta de ouro. Peguei minha pequena bússola em minhas coisas, um presente de um sábio que conheci, olhei atento a direção que devia seguir, coloquei as bolsas em minhas costas e comecei a caminhar. Deixei o deserto dois dias depois parei numa vila e jurei que jamais andaria pelas areias novamente, aproveitei o ouro para pagar a melhor meretriz e a melhor cerveja que um homem poderia desejar naquele local, curiosamente escolhi uma mulher de pele branca e cabelos negros."

o bardo Byrdh "Língua Divina" - na taverna Senhora Pureza

Nenhum comentário:

Postar um comentário